quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A Seleção dos Melhores Alevinos de Bettas Splendens

Resumo:
Alguns criadores de peixes ornamentais têm o hábito de selecionar os maiores alevinos que se destacam na desova acreditando que eles serão – no futuro - os melhores exemplares daquele lote. Muitas vezes os criadores descartam os demais e investem nestes peixes selecionados prioritariamente. Este artigo demonstra – através de experimentações e à luz de conceitos científicos - que este procedimento pode não estar correto, pois, muitas vezes, os menores filhotes podem se transformar nos melhores peixes se receberem tratamentos adequados. Neste artigo há também o depoimento de especialistas, cientistas e criadores, que colocam aqui a sua opinião sobre o polêmico assunto.
Alguns criadores, de Betta splendens, a exemplo de criadores de outros animais, adotam o procedimento de selecionar os maiores alevinos, ou seja, aqueles que se destacam no cardume, logo nos primeiros dias de vida, e investirem nesses peixes para posteriormente se tornarem os “top de plantel”, deixando o restante para segundo plano, ou até mesmo descartando-os.
Esses criadores acreditam que os alevinos que se desenvolvem primeiro serão os melhores daquela desova e conseqüentemente, apresentam, melhor material genético e, portanto, serão os animais preparados para serem as futuras matrizes. Não podemos descartar esta possibilidade, porém, a minha experiência em piscicultura ornamental mostra que excelentes peixes podem ser encontrados também no lote dos que tiveram um desenvolvimento mais lento. Para fundamentar meu ponto de vista teço os comentários abaixo:
Diferença no desenvolvimento - alevinos com 35 dias
- Figura 1 -

1. Meu Manejo de Alevinos
Meus peixes são criados em meu laboratório utilizando aquários ou caixas plásticas e, dependendo da quantidade de alevinos, com dez dias de nascidos divido a ninhada em outros recipientes. Quando estão com um mês de idade faço a primeira seleção, pois já é possível observar uma acentuada diferença de tamanho, sendo que vários alevinos se sobressaem, enquanto outros permanecem bem pequenos, dando-nos a impressão que não irão crescer. Assim, retiro os maiores alevinos e levo para os tanques de crescimento. Poucos dias depois os alevinos que ficaram passam a se desenvolver mais rapidamente e novas diferenças de tamanho começam a ficar visíveis. Aos quarenta e cinco dias faço a segunda seleção e retiro, novamente, os maiores alevinos levando-os, também, para o tanque de crescimento, ficando no aquário inicial, mais uma vez, os menores filhotes que passam a se desenvolver mais rapidamente do que os lotes anteriores, em função, principalmente, da maior quantidade de água disponível, maiores níveis de oxigênio dissolvido, melhor oferta de alimentos, menor estresse por espaço físico, etc, etc. Com sessenta dias de nascidos, então é feita uma nova avaliação e o processo é repetido a cada quinze dias até que todos os alevinos sejam levados para os tanques de crescimento.
Alevinos com 25 dias - diferenças no desenvolvimento
- Figura 2 -
Quando os filhotes machos, já acondicionados nos tanques, começam a brigar estes são retirados e acondicionados em recipientes individuais. É possível observar que de todos os lotes saem peixes bons e peixes ruins. Todos os lotes possuem peixes grandes e pequenos, peixes com grande dorsal e pequena dorsal, peixes com muita cor e peixes com pouca cor. Já vivenciei alguns casos que aqueles últimos peixinhos, bem pequeninos, que não damos a devida importância, e são deixados de lado, começam a desenvolver, tardiamente, características de peixes “top de linha” e que até poderão ser selecionados para matrizes.
Alevinos com 28 dias - diferenças no desenvolvimento
- Figura 3 -
Alguns criadores sugerem que os peixes sejam selecionados, logo no início, pelas características morfológicas que desejam, por exemplo: abertura caudal, abertura peduncular, coloração, etc. Cabe ressaltar, entretanto, que, dependendo da espécie e ou da linhagem, muitas destas características só irão se manifestar quando os animais já se encontrarem com alguns meses de idade; por exemplo, na minha linhagem super red, quase todas as fêmeas só colocam as suas cores definitivas após quatro ou cinco meses de idade. Até esta idade elas são cambojadas.
A título de informação, vale citar que o fator luz exerce significativa influência neste quesito, sendo que peixes criados sobre exposição de luz têm tendência a mostrarem suas cores mais rapidamente do que aqueles que não são criados com aquela exposição.
Vale considerar, também que a completa abertura caudal, em algumas linhagens, só poderá ser totalmente observada quando o peixe já possuir vários meses de idade. Na linhagem de white opaque que desenvolvo, por exemplo, a maioria dos peixes só mostra sua total abertura caudal após os cinco meses de idade, principalmente as fêmeas.

2. Porque alguns alevinos crescem mais do que os outros, sendo que em alguns casos os maiores chegam a comer os menores?
Temos que considerar que uma postura de uma fêmea do peixe betta produz, em média, de cem a quinhentos ovos, sendo que já foram observados casos excepcionais que este numero ultrapassou a casa dos mil ovos.
A partir do momento que o ovócito é expelido pela fêmea e fecundado pelo macho inicia-se, imediatamente, o processo de desenvolvimento daquele organismo. A corrida pela vida começa mesmo antes do ovócito chegar ao fundo do aquário, pois ele já está fecundado. Uma postura de uma fêmea pode levar horas para ser concluída e, assim, os ovos que foram fecundados primeiro conseqüentemente serão os primeiros a eclodirem e gerarem alevinos.
Os alevinos dos primeiros lotes comerão primeiro e consequentemente crescerão primeiro. Desta forma podemos, hipoteticamente, considerar que estas diferenças entre os nascimentos podem significar a diferença entre sobreviver ou servir de alimento; ser um exemplar bom ou ser um exemplar ruim.
Outro aspecto biológico a considerar é o fato dos ovos do peixe betta, quando examinados à luz da lupa eletroscópica, não apresentarem exatamente o mesmo tamanho.
Ovócitos de bettas. Não são exatamente do mesmo tamanho.
- Figura 4 -
Esta diferença pode nos indicar que suas reservas vitelínicas não possuem o mesmo volume e que os peixinhos ao nascerem não terão exatamente o mesmo tamanho (Vide Figura 3). A diferença de tamanho é muito significativa na corrida pela vida. Peixes maiores tem bocas maiores e se tornam aptos primeiro a se alimentarem de um náuplio de artemia ou um microverme e assim, hipoteticamente, poderíamos considerar, que ter a boca um pouquinho maior pode significar a diferença entre viver ou servir de alimento; em ser um exemplar bem sucedido ou em ser um exemplar medíocre.
Ovócitos - visualização da diferença no volume da reserva vitelínica
- Figura 5 -
Como vimos nos dois últimos parágrafos os alevinos que nasceram primeiro ou com maior reserva vitelínica podem apresentar melhor chance de sobrevivência, mas seriam estes os exemplares com o melhor material genético para evidenciar os fenótipos que apreciamos?
Convém lembrar que a maioria das características que apreciamos nos peixes ornamentais não necessariamente serão as mais favoráveis na natureza.

3 . Então como devemos selecionar os exemplares para serem as nossas matrizes?
Seleções rigorosas baseadas em uma única característica biológica como precocidade de desenvolvimento ou tamanho podem até resultar em peixes excepcionais, no entanto, não garantem outras características fenotípicas que queremos. Obter animais com melhor pedúnculo, dorsal, maior número de raios na cauda, etc, exigem que sejam escolhidos animais possuidores de genótipos favoráveis que tanto podem estar transcritos no DNA desses primeiros e maiores alevinos quanto na cadeia genética daqueles menores, que não se desenvolveram primeiro por questões bióticas ou abióticas desfavoráveis, ou seja, por interação inadequada com os irmãos maiores ou com o ambiente.

4. A título de curiosidade vale comentar porque uma fêmea do peixe betta produz tantos ovos.
Durante o desenvolvimento evolucionário dos organismos animais, algumas espécies sofreram, no decorrer do tempo geológico, adaptações evolutivas que as levaram a gerar muitos ovos ou muitos filhotes, enquanto outras evoluíram para gera poucos ovos ou poucos filhotes.
Segundo o postulado darwiniano, aquelas espécies que geravam poucos ovos ou filhotes desenvolveram paralelamente rituais de cuidados parentais mais aperfeiçoados com o objetivo de preservar um maior percentual de sua prole. Em contrapartida, aqueles animais que tendiam a gerar muitos descendentes não desenvolveram cuidados parentais tão aperfeiçoados preservando apenas um pequeno número de sua prole e, desta forma, por seleção natural, somente os mais fortes sobreviveriam.
Neste segundo caso, a maioria dos filhotes gerados serviria de alimento aos demais peixes do cardume, sendo até mesmo uma importante fonte de proteína ou fator de preservação daquela população ou da espécie. Acredito particularmente que o peixe betta esteja enquadrado nesta segunda hipótese.

5. Então de onde veio este procedimento de selecionar os primeiros animais que se destacam no lote.
O procedimento de separar os maiores animais de um lote de filhotes, para posteriormente servirem de matrizes, costuma ser utilizado quando o interesse principal é produzir animais cuja característica requisitada é o peso, tamanho, etc, no entanto, atualmente as empresas que trabalham com produção de animais, em escala comercial, utilizam processos de avaliação genética (baseados em marcadores moleculares) para selecionar as suas matrizes, ficando, desta forma, aquele processo de seleção “no olho” ultrapassado mas ainda utilizado por muitos produtores que não tem conhecimentos e acesso à tecnologia moderna.

6. Então qual seria a melhor forma de selecionarmos e avaliarmos nossos alevinos?
Sabemos que os principais fatores para obtenção de peixes de boa qualidade estão diretamente relacionados à água e a alimentação.
A água deve ser de excelente qualidade, isto é com ausência total do terrível trio de compostos nitrogenados: nitrito, nitrato e amônia; temperatura e parâmetros físico-químicos compatíveis com a espécie de peixes em criação.
Acredito que a qualidade da água seja ainda mais importante do que alimentação porque peixes com um mínimo de alimentação, porém com água de boa qualidade podem crescer, no entanto, quando a água está ruim, mesmo com boa alimentação os peixes atrofiam.
Sugiro a separação máxima dos alevinos, ou seja, já a partir do décimo dia de nascidos pode-se dividi-los em vários grupos; a regra é: quanto maior a litragem por indivíduo melhor será o desenvolvimento.
Quando os alevinos estiverem separados em pequenos lotes teremos um crescimento mais ou menos uniforme e poderemos remanejar um indivíduo que se destacou no seu lote, para um lote de maiores e vice versa.
Desta forma, tanto no aquário, ou em tanques poderemos avaliar progressivamente todos os peixes, selecionando os indivíduos que possuem as características fenotípicas que desejamos, sem descartar aqueles que inicialmente demoraram mais para se desenvolverem.
A TÍTULO DE EXPERIMENTAÇÃO SUGIRO QUE OS COLEGAS RETIREM OS MENORES ALEVINOS DE SUAS DESOVAS E ACONCIDIONE-OS EM RECIPIENTES, DENTRO DOS PRÓPRIOS AQUÁRIOS DE CRESCIMENTO, CONFORME FIGURA ABAIXO. TENHO CERTEZA QUE VOCES TERÃO UMA SURPRESA COM O DESENVOLVIMENTO DESSES ALEVINOS.
Seleção dos 5 menores alevinos, a cada dez dias, para comparativo do desenvolvimento com o resto da ninhada.
- Figura 6 -
Considerações:
Coloquei neste artigo as observações que venho fazendo na criação do peixe betta e que tem me propiciado, como resultado, exemplares excepcionais, com tamanho acima do padrão de mercado, no entanto, nada impede que outros criadores tenham outros pontos de vista, estejam fazendo de outra forma e estejam obtendo sucesso, por isso coloco este assunto em discussão e gostaria de ouvir a opinião de outros criadores, pois só assim poderemos evoluir na criação deste fantástico peixe.

Wilson Vianna
wovianna@oi.com.br
Graduado em Ciências Biológicas pela UNISUAM/RJ, graduado em Administração de Empresas pela UNISUAM/RJ, Pós - Grad. em Biologia Marinha pela UNISUAM /RJ, Possui trabalhos científicos publicados através do CNPQ - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, titular da Piscicultura Vianna (Magé/RJ), relações públicas e articulista da revista Mania de Bicho (RJ). Gestor do Centro de Estudos de Aquariofilia - CEA, membro da equipe de pesquisa Científica "Aquisuam” .

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